A origem e o uso da estola
- Colarinho Romano
- 11 de ago. de 2022
- 6 min de leitura

Um de nossos leitores viu um padre celebrando missa com a estola sobre a casula e pediu explicações sobre este fato. Dispostos a ajudá-lo em sua dúvida, preparamos este pequeno artigo, que trará os seguintes subtítulos:
A) O que é a estola — onde comparamos dois dicionários de liturgia para encontrar a origem e significado desta veste;
B) A obrigatoriedade e o uso da estola no Rito Romano atual — dispondo da Instrução Geral ao Missal Romano e da Instrução Redemptionis Sacramentum, apontaremos as regras atuais para o uso deste paramento;
C) Estola por cima da casula? — tendo encontrado apoio na tradição e no Magistério recente, daremos propriamente uma resposta à questão de nosso leitor;
D) A estola cruzada e o sentido prático — para reforçar, apontaremos elementos normalmente transmitidos pela tradição oral a respeito do uso da estola.
O que é a estola?
A estola é uma veste própria dos ministros ordenados, sendo confeccionada como uma tira de pano geralmente ornada com brocados ou estampas, dos quais o mais comum é a cruz, e utilizada em todas as ações sagradas onde diácono ou sacerdote exercem as funções próprias de sua Ordem.
Segundo o dicionário redigido por José Aldazábal, a palavra estola tem origem na língua grega (stolé) e era empregada na Antiguidade para designar vestes importantes ou simbólicas, como “a estola da glória imortal dos mártires” ou “a estola branca vestida pelos batizados”.
Por outro lado, o dicionário do frei Basilio Rower (OFM) traz a estola a partir do uso latino, significando-a como “toalha para enxugar o rosto”. Segundo ele, o uso da estola já era encontrado no Oriente do século IV, passando para o Ocidente no século VI, e tendo provável origem na toalha, dobrada ao longo, que o diácono trazia no ombro esquerdo enquanto preparava o Santo Sacrifício.
Ainda segundo o frei, a estola é símbolo da veste cândida no exercício de seu ministério; no sacerdote, significa o jugo do Senhor e a veste da imortalidade. Ambas as definições parecem coincidir com as informações de José Aldazábal: o símbolo no diácono remete à veste branca dos batizados, enquanto no sacerdote remete à glória imortal dos mártires, que nada mais é do que o jugo do Senhor (padecer na cruz) e a imortalidade (vida eterna garantida pela morte em nome da fé em Cristo).
Curiosamente, à uma primeira vista, a definição da estola como “toalha para enxugar o rosto” parece ligá-la ao manípulo, veste facultativa parecida com uma “mini-estola” e utilizada pelos ministros ordenados no braço esquerdo, cuja antiga função normalmente atribuída era justamente enxugar o suor do rosto.
A obrigatoriedade e o uso da estola no Rito Romano atual
A Instrução Geral do Missal Romano (n. 340) define que o sacerdote deve usá-la em torno do pescoço, pendendo diante do peito; o diácono, por sua vez, deve usar a estola a tiracolo: colocando-a no ombro esquerdo, pendendo sobre o peito e prendendo-a do lado direito.
Seguindo a cor litúrgica da celebração, a estola é usada sobre a alva e debaixo da casula pelo sacerdote; e sobre alva e debaixo da dalmática pelo diácono. Além disso, seu uso parece ser concebido como ordinário em todas as Missas, como indica a Instrução Redemptionis Sacramentum:
Seja reprovado o abuso de que os sagrados ministros realizem a santa Missa, inclusive com a participação de só um assistente, sem usar as vestes sagradas ou só com a estola sobre a roupa monástica, ou o hábito comum dos religiosos, ou a roupa comum, contra o prescrito nos livros litúrgicos. Os Ordinários cuidem de que este tipo de abusos sejam corrigidos rapidamente e haja, em todas as igrejas e oratórios de sua jurisdição, um número adequado de vestes litúrgicos, confeccionadas de acordo com as normas.
Redemptionis Sacramentum, n. 126.
O documento reprova as celebrações realizadas sem as vestes sagradas ou mesmo com o mero uso de estola sobre o hábito (batina, cogula ou outras vestes eclesiásticas/religiosas). Em ambas as sentenças, o uso da estola aparece como justo e necessário.
Estola por cima da casula?
Conforme indica o frei Rower, a estola é usada no Oriente caindo pela frente e por detrás; no rito maronita, porém, a estola pode ser usada dando uma volta no corpo superior. Enfim, em Milão, a estola é utilizada pelos diáconos por cima da dalmática.
Quanto a essas considerações do frei, duas coisas cabem observar: em primeiro lugar, o uso diferenciado da estola sobre a veste distintiva aparece geralmente associado ao diaconato, como no exemplo de Milão. Em segundo lugar, ainda que possa ser comum este tipo de uso em outros ritos, o Rito Romano concebe o uso da estola por baixo da veste distintiva, isto é, a casula do sacerdote e a dalmática do diácono.
Esta posição se reforça pelas indicações do Cerimonial dos Bispos:
A veste própria do presbítero celebrante, na Missa e outras ações sagradas, diretamente ligadas à Missa, é a casula, a qual se veste por cima da alva e da estola, a não ser que se indique outra coisa. [...] A veste própria do diácono é a dalmática, que se reveste por cima da alva e da estola.
Cerimonial dos Bispos, n. 66-67.
Como disposto, a casula e a dalmática são sempre mencionadas por cima da alva e da estola. Nesta citação, o trecho que diz “a não ser que se indique outra coisa” não diz respeito à posição da estola, mas ao fato de que em algumas ações sagradas é possível trocar a casula pela capa pluvial; a estola permanece sempre por baixo.
A estola cruzada e o sentido prático
Por fim, cabe reconhecer algo normalmente transmitido pela tradição oral (embora também possa aparecer em livros de Liturgia): o sentido espiritual da estola do presbítero é lembrar-lhe da cruz. Por isso, antes das reformas conciliares, o presbítero utilizava a estola cruzada sobre o peito. Assim, durante a celebração do Santo Sacrifício, sentiria no peito a cruz formada pelas pontas entrecruzadas da estola e se lembraria do jugo do Senhor.
Um outro significado atribuído é demonstrar que o poder do presbítero está abaixo do bispo, pois o bispo utilizava a estola sem cruzá-la (do modo como se faz atualmente). E essa disposição não prejudicava o bispo na tentativa de sentir a cruz sobre o peito, pois debaixo da sua casula também se encontrava a cruz peitoral. A própria presença da cruz já dispensava a estola ser cruzada.
Todos estes fatos denotam a importância de a estola permanecer debaixo da casula e, portanto, mais próxima ao peito.
É conveniente notar que a atual disposição da IGMR não impede que o presbítero utilize a estola cruzada, pois uma estola cruzada ainda é uma estola “pendente diante do peito”. O uso da estola nessa posição é válido, sobretudo, para a casula romana, pois a sua abertura na gola é feita justamente para ser preenchida pela estola. No caso do bispo de casula romana, a estola não precisa preencher a gola da casula porque a dalmática já faz esse serviço.
Fato interessante é que, na Solenidade da Santa Mãe de Deus em 2011, os bispos que concelebraram com o papa Bento XVI estavam de casula romana e estola cruzada, ainda que fosse o rito de Paulo VI e as normas dispensassem o cruzamento da estola. É provável que tenham preferido atuar assim porque estavam sem dalmática por baixo da casula. Abaixo, na bibliografia, deixaremos um link para o vídeo da missa.
Conclusão
A estola é uma veste própria dos ministros ordenados, cuja origem remonta aos inícios da Igreja. Seu uso é obrigatório em todas as missas, permanecendo debaixo da veste distintiva (dalmática ou casula) e seguindo a cor litúrgica do dia.
Embora seja possível fazê-lo em outros ritos, é reprovável o uso da estola por cima da casula ou dalmática no rito romano. Pedimos aos sacerdotes que, conhecendo os elementos da tradição e da essência da liturgia, façam bom uso das coisas que lhe são permitidas e entreguem todo seu amor e fidelidade a Nosso Senhor Jesus Cristo em seus santos altares.
Deus seja louvado para sempre!
Equipe Colarinho Romano.
Bibliografia
Cerimonial dos Bispos. Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos. Paulus, 2001.
Diccionario Liturgico. Frei Basilio Rower, OFM. Petrópolis, RJ: Vozes, 1936.
Dicionário Elementar de Liturgia. José Aldazábal. Paulinas, 2007.
Instrução Geral do Missal Romano. Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos. CNBB, 2002.
Instrução Redemptionis Sacramentum. Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos. Paulinas, 2004.
Vídeo da Missa com Bento XVI: Solenidade da Santa Mãe de Deus, Vaticano, 2011.
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